Quando eu era garoto, existia um quadro do Jô Soares na TV em que o protagonista resumia conversas longas e cheias de rodeios em uma só palavra que dizia tudo, sempre introduzida por "vou no popular". A idéia deste blog é ser claro nas opiniões. Vamos falar também de filmes, músicas, livros ou qualquer trabalho que valha a pena comentar.



terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Cabeça de cavalo verde

Certo dia bateu em minha casa uma senhora velha amiga da família. Ela trazia um presente numa grande caixa de papelão. Minha mãe recebeu a prenda e sem delongas abriu-a ali mesmo na sala de estar, diante de mim, de meus irmãos e, é claro, da visita.

Foi uma surpresa, grande e embaraçosa, era uma enorme cabeça de cavalo verde de cerâmica esmaltada. Era perceptível que minha mãe ficou sem palavras, então a visitante se adiantou: “Esta cabeça é para ser colocada encima do piano”.  Não precisava dizer nada, estávamos todos chocados.

Na pequena sala de visitas tínhamos um antigo piano de madeira entalhada que pertenceu, no início do século XX, a algum senhor fazendeiro que plantava cacau na Bahia. O conjunto, cabeça de cavalo e piano, correspondia a 50% do cômodo, as cores marrom e verde formavam uma combinação pouco agradável aos olhos. O presente acabara de chegar e já precisávamos nos livrar dele.

A mãe que era muito sincera, não o pode ser naquele momento. Sorriu amarelo e agradeceu pela cabeça colorida e desproporcional.

Após a saída da visitante fizemos uma reunião de emergência. Não havia hipótese de manter meio cavalo verde sobre o piano, mas como fazer já que a estimada senhora nos visitava constantemente? A ideia que tivemos era a de que toda vez que nossa velha amiga viesse colocaríamos o cabeção no lugar que ela determinou. A princípio a operação parecia fácil.

Quando ela tocava campainha, olhávamos pela fresta da janela e corríamos para colocar o bibelô no lugar, ficava imaginando o quanto seria bom deixa-lo cair. O procedimento foi ficando infernal, correr com aquele cabeção era chato, muitas vezes não sabia onde ele havia sido guardado pela última vez, era comum, por algum motivo de organização, ser colocado em um quartinho separado nos fundos da casa.

Estávamos decididos, precisávamos quebrar aquele objeto equino. Seria fácil, era só deixa-lo cair no chão. Assim foi feito... Acredite, ele não quebrou. A consciência doeu e resolvemos dar outra chance àquela cabeça.

Certo dia ao chegarmos em casa recebemos a notícia, de uma moça que lá trabalhava, de que o enorme enfeite havia caído e quebrado enquanto ela limpava o quartinho dos fundos. A cabeça de cavalo verde havia nos deixado. A heroína que nos livrou da peça não entendeu por que ficamos tão felizes.

O inusitado presente não existia mais, hoje nem o piano, minha mãe ou nossa ilustre visitante, apenas a lembrança de um episódio que se tornou divertido em nossas memórias.

Um comentário:

  1. Orgulhosamente PUBLIQUEI uma 'chamada' para este ótimo artigo no NOVO SITE agregador de LINKS dos Blogueiros do Brasil (( http://omelhordos.blogueirosdobrasil.com/ )).

    Abraços cordiais.

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